domingo, 17 de fevereiro de 2013

Em defesa de Orson Scott Card, e um protesto contra o absurdo.


Acho que certos ativistas que lutam pelos direitos dos gays já estão indo longe demais. Agora querem proibir o escritor Orson Scott Card de escrever histórias do Super-homem, porque o sujeito em questão é um membro da National Organization for Marriage, um grupo que faz lobby nos EUA para manter a proibição de casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Basicamente, o argumento que alguns ativistas* contrários a Card utilizam é o de que o Super-homem representa o que há de melhor nos homens, e como eles não consideram o sr. Card um bom homem (porque sustenta opiniões diferentes das deles), então ele não seria digno de escrever uma história de um homem que representa o bem. Há muito tempo eu não leio uma bobagem tão grande. Explico.Vamos assumir, só por um momento, que o sr. Card seja um sujeito maléfico, só porque considera errado que os gays assumam matrimônio entre si. Agora imagine se generalizássemos este julgamento, segundo o qual apenas bons homens podem escrever histórias sobre o Super-homem, e o transformássemos em lei: então TODOS os escritores deveriam passar por um teste de moralidade e excelência ética. Agora vamos assumir que semelhante teste seja possível. Se aprovados, então os escritores testados poderiam escrever o Super-homem; se reprovados, então não poderiam. Fácil concluir que, se isso fosse posto em prática, o personagem já teria sido esquecido, porque jamais surgirá um ser humano tão bom assim. Pois a imperfeição moral do gênero humano é um fato incontestável. Portanto, o protesto em si já é absurdo, porque se baseia em um princípio absurdo. 

Mas vamos analisar o modo pelo qual estes ativistas estão agindo: encontraremos mais absurdos. Aqueles que não concordam com as opiniões de Card estão organizando um boicote contra ele, que compreende desde simples campanhas para que as pessoas não comprem os trabalhos por ele escritos - o que é tolerável e permissível, embora injusto -, até petições dirigidas à DC Comics para que a empresa demita o homem**. Há até uma distribuidora de quadrinhos que já declarou que não irá receber as edições assinadas por Card***. Basicamente, querem que o sujeito perca o emprego e que seja impedido de trabalhar por causa das convicções políticas e morais que sustenta. Aqui não há somente absurdo: há também hipocrisia descarada, sobretudo se considerarmos que os responsáveis por esta verdadeira caça a Card são justamente aquelas pessoas que exigem, em seus discursos, tolerância e liberdade de expressão. Tais fanáticos deveriam fazer o que todas as pessoas lúcidas de espírito sempre fizeram ao analisar um trabalho de ficção: saber distinguir o autor de sua obra. Por acaso ler as HQ's escritas por Alan Moore ou Grant Morrison implica apoiar o uso eventual de drogas alucinógenas – simplesmente porque eles já alegaram tê-las usado - e adoção de crenças ocultistas – que eles afirmam cultivar? Creio que não. (Particularmente, eu aprecio muito os trabalhos de Moore e Morrison, mas como homens, considero-os uma dupla de patetas exóticos). Os ativistas que lutam pelo direito de pessoas gays se casarem deveriam aplicar o mesmo raciocínio em relação a Card. E eu mal posso esperar pra ler estas histórias do Super-homem assinadas por ele. Se forem ruins, eu simplesmente direi: “são histórias ruins”. Se forem boas, eu simplesmente direi: “são histórias boas”. Só isso. Sem essa de "Card é moralmente mau", "Card é indigno", "Card, é um homofóbico maldito", etc.

* Posso citar Glen Wedon (http://www.npr.org/2013/02/17/172229592/man-of-tomorrow-superman-orson-scott-card-and-me) e e Andrew Weeler (http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2013/feb/14/orson-scott-card-superman-boycott)

** https://www.allout.org/en/actions/dccomics-osc

*** Trata-se da Zeus Comics, cf http://www.newsarama.com/comics/orson-scott-card-superman-controversy.html

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